sábado, 5 de março de 2016

A janela

Aqui, do outro lado do mundo, trancado num cubículo frio e úmido, meu olhar se mantém fixo na única luz presente — uma janela acesa, no meio da escuridão. O único ruído audível é o dos meus dedos alcançando as teclas de um piano sem som. Apenas palavras são possíveis naquele angustiante contato; palavras silenciosas. Mas quase sinto a textura das suas mãos, quase sinto tocar seu rosto e ouvir seu riso fácil. E através daquela janela iluminada, posso ver seus olhos, numa foto tirada recentemente.

Levanto-me, abro um livro. Está escuro demais para ler. Olho o violão, mas desisto. Faltam-lhe duas cordas. Volto à janela e encaro seus olhos outra vez. Faço-lhe uma pergunta, mas a resposta não vem. Espero, assim como você sempre me esperou. Como anda sua vida? Seus amigos ainda devem insistir que não temos futuro; você deve estar cansada disso. Será que ainda espera? Você sabe que foi a necessidade que nos manteve separados, todo esse tempo, com tanto mar entre nós. As pessoas dizem para desistir, que a saudade tende a diminuir com o tempo. Bem, não a minha. Mas nada posso dizer quanto a sua.

A resposta não chegou. Talvez a rede tenha caído. Se eu tivesse outra coisa para fazer, talvez a angústia não me invadisse daquela maneira. Angústia e dúvida. Esperarei você voltar. E, um dia, atravessarei esse tanto de mar só para vê-la, apenas mais uma vez. Mesmo que você não queira mais me ver. 





"Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar…
Sei também quanto é preciso
Navegar, navegar…"







Texto publicado pela primeira vez em 2009

Um comentário:

Rayssa Macedo disse...

Belo texto, Mah!