
Eu não deveria, mas vou dizer algumas palavras sobre essa onda xenofóbica que acometeu o país desde que "os nordestinos" elegeram a primeira presidenta do Brasil. Já formulei milhares de argumentos para ridicularizar essa afirmação, mas não pretendo entrar na questão da política do Nordeste aqui, tampouco vou sair discutindo as questões que levaram o Brasil a eleger Dilma Rousseff.
O fato é que, depois de voltar do feriado, abri o twitter e me deparei com inúmeros comentários absurdos em relação aos nordestinos. Vou dizer uma coisa a vocês: nunca neste Brasil alguém vai chegar ao Recife com um sotaque diferente e ser ridicularizado por este motivo. Ou pior, ser agredido fisicamente. É porque os cariocas, os paulistas, os gaúchos são melhores que a gente? Desde pequena eu aprendi que ninguém é melhor que ninguém, seja branco, preto, azul, gay, mulher, alemão, soropositivo. É estranho crescer e perceber que, na vida real, não é bem assim. É triste pensar que nasci neste país e que poderia ser maltratada numa das suas muitas cidades simplesmente por me julgarem menos do que eu sou. Depois perguntam por que nordestino é tão orgulhoso. É o preconceito alheio, que faz com que procuremos força em nós mesmos contra o resto do mundo.
Está além da minha capacidade entender por que, num mesmo país, se acostumou a separar pessoas ao invés de unir. Logo hoje, nesta geração globalizada, em que importamos cultura até mesmo de outros países. Quer dizer que receber estrangeiros na sua cidade perfeita está ótimo, mas aturar "cabeças-chatas" é trabalho demais?
Menos do que raiva, sinto pena dessas pessoas limitadas. São pessoas que nunca vão conhecer o carnaval do Recife ou o de Salvador com o coração aberto das pessoas livres. Nunca vão aprender a apreciar a simplicidade das músicas de Luiz Gonzaga e Dominguinhos, ler um livro de Ariano Suassuna, ou entender um filme como Lisbela e o Prisioneiro. Nunca vão conhecer as praias de Pipa, ou de Porto de Galinhas. Nunca, mas nunca, vão admirar as peculiaridades da diversidade cultural brasileira, que tantos já cantaram. E nunca vão entender um nordestino que foi capaz de cantar tão bem as belezas de uma terra que não era sua.
Imagino que seja cansativo conviver com todas essas restrições e esse coração pesado por toda a vida. Prefiro viver em paz, livre dessas coisas que, no final, não tem valor nenhum.
"Sem lenço e sem documento
O peito cheio de amores vãos.
Eu vou, por que não?"
Imagem: GettyImages
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