— Alô?
— Alô.
— Quem fala?
— Eu.
— Com quem quer falar, por gentileza?
— Com você.
— Comigo? Quem fala?
— Eu falo. Você fala também.
— Ora, eu tenho mais o que fazer! Com licença...
— Não, não desligue, por favor!
— ...
— Está aí ainda?
— Estou. O que você quer?
— Apenas conversar. Você se importa?
— Claro que me importo. Você não tem amigos?
— Até tenho. Mas eles não me entenderiam. Só tenho uma amiga que entenderia, mas ela não fala mais comigo. E eu preciso mesmo conversar com alguém.
— Por que eu?
— Sei lá, destino, acho. Você está ocupada?
— Estava estudando. Tenho prova amanhã.
— Eu tenho também. Mas não estou me importando.
— Acontece que eu estou me importando. Você pode até ser um irresponsável, mas eu não sou.
— Não pode parar apenas por uns minutos?
— Sobre o que você quer conversar?
— Problemas.
— Isso é óbvio. Já ouviu falar em alguém desesperado para conversar banalidades com alguém?
— Ora, não seja rabugenta.
— Então pare de enrolar e diga logo o que você quer!
— Se for escutar nessa má vontade, eu não quero mais.
— Ótimo! Adeus!
— Não! Não desligue! Está bem, eu falo. Mas prometa que não vai ser muito dura comigo.
— Não prometo nada.
— Puxa, você não cede um milímetro, hein?
— Ainda estou aqui, não estou? Então reclame menos e comece de uma vez essa história.
— Está bem! É o seguinte...
— ... Então?
— Calma. Estou pensando como começar.
— Ai, céus!
— Você está sentada?
— Não.
— Então sente, que a história é longa.
— Você quer testar mesmo minha paciência, não?
— Sentou? Então. Eu conheci uma garota...
— Logo vi.
— Hein? Como assim?
— Problemas com mulheres. Típico. Vocês homens são todos iguais mesmo.
— Quer que eu continue ou não?
— Eu não interrompi.
— Ah, não?
— Você fez uma pausa. Julguei que quisesse um comentário meu.
— Quando eu quiser um comentário, eu peço.
— Não precisa ficar nervosinho!
— Você que veio com o papo de que homens são todos iguais.
— É a verdade!
— Ah, não vou discutir isso com você agora.
— Então pare de besteira e continue logo essa história.
— Continuar… Você nem me deixou começar ainda! Nem sei mais onde estava...
— Eu ajudo. Você havia dito: “eu conheci uma garota”.
— Eu sei o que disse.
— Então por que perguntou?
— Eu perguntei?
— Claro que perguntou!
— Ah, não importa. Eu conheci uma garota…
— Você já disse isso.
— Dá para ficar calada?
— Não me mande ficar calada! Eu estou aqui fazendo um favor.
— Se você ficar quieta, mais cedo terminamos e mais cedo você volta aos seus livros.
— Ok. Vá em frente.
— Eu conheci uma gar...
— Tá, e daí?
— Faz algum tempo.
— Alguns meses?
— Alguns anos.
— Nossa! Esse tempo todo de amor platônico?
— Quem falou em amor?
— Sei lá, eu pensei...
— Não pense. Mulheres não foram feitas para isso.
— Olhe aqui...
— É brincadeira! É brincadeira!
— Se essa garota deixou você, posso entender por quê. Você é um machista!
— Já disse que estava brincando.
— Eu não tenho tempo nem paciência para brincadeiras.
— Tá, mal humorada! Essa garota tornou-se uma grande amiga. Mais que isso; ela se tornou minha melhor amiga.
— Ah! É aquela que não fala mais com você? Posso entender por quê, também.
— Vou ignorar seu comentário. É ela mesma. Minha melhor amiga.
— Quer dizer que aquela que ouviria seu problema, caso você não estivesse brigado com ela, é exatamente o problema?
— É, mais ou menos isso.
— Está vendo que eu sei pensar?
— Nossa, estou admirado!
— Sem ironias, por favor. Por que ela não fala mais com você?
— É um pouco complicado...
— Com certeza a culpa é sua.
— Vocês mulheres sempre se defendem.
— Afinal, o que houve?
— Bem... Eu tinha uma namorada...
— Tinha?
— Sim, tinha. Acabou.
— Ah, certo.
— E essa amiga não gostava dela.
— Assim, sem motivo?
— Eu achava que sim.
— E não era?
— Ela me traía.
— E sua amiga sabia?
— Ela que me disse.
— E você não acreditou.
— Eu gostava muito dela! Tive que vê-la com outro para cair a ficha. Foi terrível, se quer saber.
— Você é um idiota.
— Também não precisa humilhar!
— E você quer que eu diga que você está certo? Pensei que quisesse alguém que lhe dissesse a verdade. Além do mais, eu não sei agir de outra forma. Já deve ter muita gente passando a mão na sua cabeça por ter sido tão cruelmente traído.
— É verdade. Não sei onde estava com a cabeça, quando liguei para você.
— E, no final, a culpa foi sua mesmo, como eu pensava.
— Eu realmente não deveria ter ligado para você.
— Concordo plenamente. Mas já que ligou, o que quer de mim?
— Compreensão. Ajude-me.
— Em relação a quê?
— A tudo. A qualquer coisa.
— Em outras palavras, você quer uma amiga.
— Isso.
— E você quer uma amiga mal humorada?
— Sim.
— E sincera ao extremo, para apontar cada um dos seus erros?
— Não quero nada menos que isso.
— E vai aceitá-la assim, do jeito que ela é?
— De qualquer jeito.
— E não vai dar mancada com ela?
— Farei o impossível.
— Então admite, pelo menos uma vez na vida, que estava errado?
— Você não vai sossegar mesmo, não é?
— Admite?
— Admito.
— Então você tem uma amiga, Edu.
— Que alívio, Cris! Não sabe como é bom tê-la de volta.
18 comentários:
kkkkkkkkkkkk
é sempre assim, eles preferem acreditar nas piriguetes.
depois voltam todos chorosos
cruela | Homepage | 10.17.09 - 4:39 pm
Pior que perder um "amor" é perder amor de amigo. Infelizmente já passei por isso, não é fácil não. Excelente conto.
Abraços.
Luciano A.Santos | Homepage | 10.17.09 - 5:08 pm
^^
Eu podia estar cega, arriada os 4 pneus, etc, mas eu acreditaria nos meus amigos!
=)
Mas tb n vou dizer nunca..
Apesar de que, em sã cosciência, poder dizer: nunca deixaria de acreditar nos meus amigos!
E perdoar é uma arte!
=*
Mari Matos | 10.17.09 - 7:24 pm
Muito bom, guria! Eu li num jato do começo ao fim e admito que me pegaste de surpresa. Adorei o desfecho! Ah, e mais: não é que encontro aqui um outro Edu tão cabeça-dura quanto eu?
Obrigado pelo conto e parabéns pela criatividade...
Abraços!
Eduardo Trindade | Homepage | 10.17.09 - 7:46 pm
Ah! Eu me lembro desse! =D
Mas não lembro o meu comentário na época... =/
Enfim... É uma conversa sensacional. Só depois de ler o final é que você entende o início. Muito bem feita, e que fala de uma amizade que deveria ser muito valorizada.
É simples, rápida e tira aquele sorrisinho da gente no final. ^^
Beijão, ma!
Bruno | 10.18.09 - 12:00 am
Nossa, adorei o texto. Achei super criativo, e com uma dinamica mto legal!
Show de bola!!!
Nabia | 10.18.09 - 12:01 am
Que texto bacana!
Adoro finais surpreendentes.
=)
Laila | Homepage | 10.18.09 - 12:15 pm
AMEI!
Me surpreendi, não esperava que a pessoa do outro lado da linha era justamente a amiga!
Excelente diálogo!
Larissa | Homepage | 10.18.09 - 3:56 pm
Genial! Genial! Esplêndido post! Marina, sou seu fã número um, menina!
Dalleck | Homepage | 10.19.09 - 12:09 am
Uau!
Vim aqui agradecer a visita em meu blog... e me deparo com essa maravilha da literatura!
Ah! Mas obrigado pela 'visita', de qualquer forma! Rssss...
E PARABÉNS! Virei mais vezes aqui.
Hum... Como 'chegou' no meu blog? (curiosidade de 'sagitariano q sou... rs...)
Bjão!
Guilherme Ramos | Homepage | 10.19.09 - 8:43 pm
Adoro contos que são somente dialogados. E eles só funcionam quando simpatizamos com as pessoas que dialogam, e se o escritor consegue dar dinâmica e química pros dois.
Você conseguiu tudo isso. Mas... Não sei como te explicar, mas no meio da conversa eu já tinha sacado que era a amiga dele. =/
Não faz o menor sentido por que você fecha bem as pontas e esconde bem o jogo, mas eu senti que era a amiga.
Mas isso não tira o mérito do conto.
Parabéns.
Bruno Portella | Homepage | 10.20.09 - 11:24 am
Eu conheço esse conto... x)~
Helo | Homepage | 10.20.09 - 10:26 pm
Muito bom e divertido o diálogo; se bem que já dava pra notar pelo meio que eles se conheciam. O que não tira os méritos, claro. Não é muito fácil escrever uma história sem narrador, deixando só os personagens falando. Mas nessa tu te superou. hehehe
Me diverti muito e gostei mesmo!
Beijão!
Marcelo | Homepage | 10.21.09 - 1:44 pm
É eu sempre te vi nos comentários tbm.. e nunca tinha entrado aqui.
Adoro diálogos. Adoro.
Muito fluente!
bom mesmo! ;D
seja sempre bem vinda.
Jullia Amaral | Homepage | 10.23.09 - 5:43 pm
Boa sacada! Adorei!
Natacia Araújo | Homepage | 10.24.09 - 12:19 am
O teu melhor texto. Nem tem pra onde discutir...
Adorei tudo, a fluência dos diálogos, tudo tudo!
Álisson da Hora | Homepage | 10.24.09 - 12:26 pm
Adorei! Diálogo fluente, jogo-rápido, e um final surpreendente.
Parabéns Marina! Qndo sai seu livro, hã? rs
Lohan | 12.02.09 - 12:55 am | #
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