sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Qualquer coisa


Necessidade. Como aquela de ir ao banheiro, depois de uns copos de cerveja. A urgência que nos faz usar mesmo aquele banheiro químico dos carnavais de rua. Sinto-a em todos os segundos que passo sem escrever. Já fazem longos segundos. Longos dias. Longos meses.

Todo artista tem uma necessidade quase primitiva de criar. O escritor não é diferente. Mas criar nunca é fácil. Exige tempo, exercício, constância. As ideias não faltam, a inspiração não some, mas se perde a noção para reconhecê-las, alcançá-las e transformá-las em algo. Isso se adquire com prática. Como qualquer exercício.

Este é um exercício. O início de um, com pouco peso e quase nenhuma intensidade. Um ato de escrever qualquer coisa, pegar o papel e sair discorrendo. Metalinguagem ajuda. Escrever essas linhas já ajuda. É um começo. Tudo precisa de um ponto de partida.

Começar. Prosseguir. Nunca parar.

Porque preciso escrever. Qualquer coisa serve.


Imagem: GettyImages

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Momentos e música*

Uma vez, alguém me disse: "não associe uma música a alguém" e eu sempre soube que essa pessoa tinha razão. Mas é difícil; a gente termina associando tudo nessa vida e eu sou dessas que associa tudo a música. Então basicamente esse é um desafio que eu nunca cumpri. E esse é um dos motivos pelos quais eu choro por tudo, por nada. Esse e o fato de eu ser mole mesmo. O problema é que, por já ter nela meio intrínseco esse componente emocional, a música meio que preenche as lacunas de sentimento que falta. Aí a gente traz para junto, para dentro, para a vida. Associa. Perde e chora.

Uma vez, aconteceu de eu gostar muito de uma pessoa que me emprestou um CD. Só que a pessoa não gostava tanto assim de mim e isso foi bem ruim. Foi embora, mas as músicas do CD ficaram. Passei muito tempo para conseguir dissociá-las da pessoa, ainda mais porque elas só falavam em sentimentos fortes, amor e perda. Consegui, enfim, desligar as músicas da pessoa, mas elas ficaram irrevogavelmente ligadas àquele momento.

Hoje, eu sinto um grande carinho pelas músicas. Hoje, elas não machucam. Acho que ligar música a momentos faz essa coisa de associar música a pessoas daquele momento ser mais suportável. Momentos criam saudades saudáveis, fazem parte da nossa vida e, mesmo que doa, a dor ameniza e a lembrança fica. A música fica e adquire um sabor melancólico. A música fica com o momento e permanece. E os momentos são nossos. As pessoas, elas não são de ninguém.
"And the songbirds are singing

like they know the score"


Imagem: Flickr - Creative Commons
Música: Songbird
*Texto publicado em 2014