quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Para você que não precisa do feminismo

Você acorda cedo todos os dias, se arruma, faz maquiagem, escolhe a roupa, sai para o trabalho. Pega seu carro ou o metrô, enfrenta o trânsito, lida com clientes ou chefe chato. Às vezes, lida também com assédio. De colegas, clientes, chefe, desconhecidos no elevador ou no caminho para o escritório. Nada de novo. Almoça em qualquer restaurante barato, volta para o escritório, trabalha mais um pouco. Sai do trabalho direto para a academia, come qualquer coisa antes da aula de pilates. Hora do anticoncepcional, não pode esquecer. Chega em casa, toma banho, tira a maquiagem, passa cremes no corpo, seca o cabelo, faz um lanche de baixas calorias. Fica em frente à televisão ou no computador, até o cansaço levar a melhor.

"Eu não preciso do feminismo por nenhuma razão"

Você é mulher. Brasileira, solteira, livre. Pagando suas contas ou não, sua vida não é fácil. Mas não é nem perto de ser tão difícil quanto era há cinquenta anos. Ou mesmo vinte. Ou, pasme, dez. Hoje, você pode trabalhar fora de casa, votar, dirigir. Talvez ninguém cobre que você saiba cozinhar ou passar roupa. Você pode discutir ideias. Pode não casar, muito menos com alguém que você não quer. Pode até sair sozinha. Só vai ouvir umas dez recomendações de alguém, antes disso. Ou, se não ouvir, vai sair assim mesmo, com o medo habitual de ser encurralada em algum beco escuro por algum estuprador. Com o medo de beber em algum bar e colocarem algo em sua bebida. Medo de dirigir e o carro quebrar no meio do caminho, deixando-a vulnerável. Medo de se relacionar com algum doido que seja violento. Medo de tirar fotos íntimas e elas vazarem. Medo de usar uma roupa mais curta e ficarem falando. Medo de ficar com vários caras e virar assunto na cidade. Mas você está acostumada com esses medos, não é?

Então, você conhece um cara legal e começa a namorar. Você não precisa ter mais medo, porque agora você sai acompanhada, ele não é violento e você confia nele. Um dia, ele resolve sair sozinho e você pergunta para onde e com quem, só de curiosidade. E ele a acusa de estar tentando controlar a vida dele. Você, para ser uma namorada legal, deixa a pergunta para lá. Aí ele começa a receber mensagens constantes de uma menina que você não conhece. Você acha estranho e pergunta quem é. Não é uma grande coisa perguntar. Ele diz que você está doida por estar desconfiando dele sem que ele nunca tenha feito nada. Mulher é sempre doida, desconfiada. Não é nele que não confia, é nas outras mulheres. Ele a acusa de ter amigos também e ele não fica no pé. Você começa a achar que está mesmo ficando doida. Você pede que ele avise quando chegar em casa, para você não ficar preocupada. Ele diz que não tem necessidade disso, que faz tudo por você e você só fica desconfiando, perguntando besteira e controlando os passos dele. Você começa a ficar com dificuldade de lembrar das vezes que foi livre e despreocupada e começa a se achar uma péssima namorada. E começa a perguntar menos, incomodar o mínimo, sorrir ao máximo. Mesmo sem motivos. Mas, ainda assim, ele sempre diz que você era mais legal no começo do namoro. Aí o namoro acaba e você não sabe onde errou. A gente nunca sabe, mas sabe que foi a gente. Até pensar direito e descobrir que esteve sofrendo lavagem cerebral. Na próxima vez, você não vai deixar isso acontecer.

Você vai a uma reunião de família, a tia pergunta por que você não tem namorado. Com certeza, você está sendo exigente ou tem algo errado com você. Não pode continuar solteira, ninguém é feliz sozinho. Você vai morrer sozinha, amargurada, sem filhos. A prima diz que vai apresentar um amigo muito legal a você. Você não pode mais se dar ao luxo de escolher muito, afinal já passou da idade. E mulher tem prazo de validade. Mas você nem queria muito; só queria alguém que fosse companheiro, soubesse conversar, tivesse o mínimo de coisas em comum, desse valor às suas opiniões. E, se não fosse muito machista também, seria bom. Mas isso é uma raridade, você não pode esperar isso de ninguém. Então, você fica só, eternamente procurando, tentando ou esperando; entre saídas com amigos, ficadas desinteressadas e maratonas de séries no Netflix.

Você não precisa do feminismo. Não mesmo. Você é uma mulher numa a sociedade machista, tem que se acostumar. E ela já foi mais machista; há países onde mulher nem pode trabalhar, escolher marido ou se vestir do jeito que quer. Aqui nem é tão ruim, você só precisa nadar a favor da corrente. Não dá para se revoltar contra tudo também. Você só vai ser uma chata, extremista, do contra. Para quê? Nenhum homem vai querer uma pessoa assim.

Sua vida realmente não é fácil. Verdade. Mas isso deve ser normal. Afinal, a vida de ninguém é fácil.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Choices and changes

Não é estranho quando você não encontra muitas coisas que você gostaria de fazer na vida. Quando você para e pensa que só há aquele caminho a seguir, que aquele é seu objetivo, seu destino. E não pensa em mais nada. Acho que esse é o curso natural das coisas, a maneira como todas as pessoas pensam ou sentem. Isso não é estranho. Estranho é quando você consegue pensar em pelo menos cinco coisas que você gostaria de fazer, cinco caminhos diferentes a percorrer. Todos lindos, todos diferentes, e você tem que escolher um. Cada um mais cheio de desafios que o outro.

Eis que você, finalmente, escolhe um. Porque, na vida, a gente precisa escolher e cada escolha é aquele famoso paradoxo: você escolhe uma coisa e deixa as outras irem. E a gente precisa ser feliz com o que escolhe. Exceto quando, depois de muito tentar, não consegue.

Então, sempre há tempo para voltar atrás. E acho que é isso: estou voltando.

"Turn and face the stranger"